7.4.09

Beijas-me?


dos textos ridículos,
que também são necessários


Não fales alto que o coração não ouve. Faz-me antes as perguntas a que não ouso responder, aquelas bem presas debaixo da língua, quase quase a sair, mas a boca fecha-se vulnerável pois os trejeitos, aquelas covinhas meigas a meio da face, a denunciarem-te. Somos gente estranha a quem o asfalto da estrada provocou mazelas profundas, são dores e dores durando a dor dos dias. Ficámos estáticos na corda do tempo, a crueza de saber que as estradas são as nossas vidas, timbrada em sons agudos, sons que nunca encontram obstáculo onde fazer eco. Se tento encaixar os meus lábios nos teus, o molde é diferente e eles não se juntam. Do mesmo modo, beijar-te em ricochete, quando menos esperas, apanhar-te de olhos vazios no branco da parede, pregar-te os lábios num estalido, mas nem assim. Os teus lábios não correspondem, continuam brilhantes e carnudos, no entanto, nada. O problema não é de fabrico, os meus olhos não mentem ou deturpam. Engataste-me em ti como carro em movimento perpétuo. O que fazer aos amores que vieram para ficar e que nos alugaram o coração definitivamente? Não é da minha personalidade fazer promessas, porém, transfiguraste-me, quem morava aqui já não mora, cresceu, emancipou-se. Prometo querer-te.
Triste de quem procura ser feliz, prolongar a vida com a maior das vendas nos olhos: a ilusão. Sei bem do que falo, tanto no oito como no oitenta, ciclos constantes de insatisfação, ora ladrão justiceiro de espada erguida, ora pedinte de rua sem pão na boca. O culpado sei-o eu. Os teus lábios. A utópica morfina das dores e dores que duram a dor dos dias. O que fazer quando rescindir não é opção válida? Sacudir a poeira dos sonhos? Preferiria antes ser assolado pela tragédia. Que me cubra, me tape os pés frios porque na ambição de chegar mais alto destapei-os, desleixei-me. Lá se vai o alicerce da esperança. Eclipsei-me, deixei-me vencer pelas dores e dores que duram a dor dos dias. Repara bem em tudo o que escrevi e sepultei atrás, tudo porque uma coisa cá dentro, uma espécie de relógio de pêndulo parado, não sabe estar calada. E repara bem agora. A resposta já a conheço, mas questionar não custa nem ofende. Beijas-me?




fs

5 comentários:

Anónimo disse...

eu beijava :) com amizade...

freespirit disse...

Pois não custa nem ofende:

onde aprendeste a escrever tão bem?

Um abraço amigo.

José Pires F. disse...

Um final excelente.

Forte abraço.

Graça Pires disse...

Gostei mesmo deste texto. "O que fazer aos amores que vieram para ficar e que nos alugaram o coração definitivamente?... Questionar não custa nem ofende..."
Um abraço.

Anónimo disse...

não existe nada de ridiculo aqui.


antes o texto que surpreende e prende.


. o meu melhor abraço.


sempre-!


.piano.